8 de outubro de 2015

A beleza do banal

Estava tratando as fotos desse trabalho e parei nessa foto. Parei e senti.
Ia fazer essa postagem no facebook mas comecei a escrever mais do que imaginei e decidi que seria importante trazer esse texto para cá.


Adoro esses entre-momentos do dia a dia, da rotina e dos pequenos gestos. Para muitos uma foto dessa não diz nada mas eu vejo muita beleza em um movimento simples como esse, por mais banal que ele pareça ser. Ele é cru, é real e tem uma essência que toca a minha alma.
Já faz um tempo que momentos como esse me alimentam, muito tempo aliás. Acredito que meu interesse pela fotografia vem de cenas como essa mas por muito tempo fiquei preocupada em aprender e a fazer o feijão com arroz. Foi importante, aprendi, copiei e reinventei fotos que eram a minha referência e a partir daí comecei a encontrar e criar o que tinha de meu, criei meu próprio estilo. Aprendi a fazer fotos que eram aceitas como um trabalho bonito, um trabalho que muitos querem ter. Afinal, quem não quer colocar uma foto bonita da sua família feliz sorrindo no porta-retrato em cima do piano da vovó? Até eu quero fotos assim para mim! Mas não só isso.
Eu quero ter fotos que falem profundamente da minha alma, e quero fazer fotos assim para as pessoas, imagens e memórias que toquem a alma delas.
Por isso que quando chega algum adulto e pede para uma criança sorrir, isso racha o meu coração (ok, sei que estou sendo dramática mas é fato...). Eu não quero fotografar uma criança sorrindo e "feliz". Eu quero fotografar a criança, do jeito que ELA É. Se sorrir ótimo, que seja um sorriso genuíno, se não sorrir, que eu consiga captar a profundidade de seu olhar, de quem ela realmente é naquele momento.


Essa é a família da Carol. Amo essa foto! Se ela tivesse pedido para a Isabel sorrir, essa imagem não teria o mesmo peso. Eu amo de paixão esse olhar da Isabel. É ela, sendo ela, ela me encara e é verdadeira em sua essência, é assim e ponto, sem máscaras. Eu amo o movimento dessa foto, a forma como as pessoas se relacionam, os olhares, esse entra e sai e toda a dinâmica neste quadro. É livre, é sem direção, é a foto da família da Carol. É natural, é simples, é autêntica e tudo isso flui em minhas mãos, eu sinto e quase posso tocar. Definitivamente uma das minhas favoritas!


Faz um pouco mais de um ano que fui fotografar a família dela, mas em outro dia não no dessa foto acima. Fui com uma proposta diferente, fui fotografar sem planos, sem direção ou sugestões, sem nenhum controle ou dedo meu para transformar o ritmo natural da casa. Fui fotografar o que eu via e o que me tocava. Isso me encantou, fiquei alucinada! E depois... fiquei confusa, fiquei absolutamente perdida. Eu tinha encontrado uma voz que cantava baixinho, a minha voz, e vi o caminho por onde quero seguir. Depois daquele dia não sabia como poderia continuar a fotografar se não fosse daquele jeito.
Brinco que abri a minha pequena caixa de Pandora, onde o bom e o ruim saiu de lá de dentro.
E no meio de tanto medo e beleza, me fechei e voltei a fazer o que sempre faço, continuei fotografando sorrisos felizes, continuei falando onde as pessoas tinham que se posicionar, continuei pedindo para o pai jogar o filho para o alto ou para a mãe beijar a filha.
Gente eu amo o que faço, e adoro poder proporcionar fotos bonitas para os meu clientes. Eu amo ter fotos das minhas filhas assim. Mas eu quero ir além! Quero poder entrar em contato com uma essência mais profunda, com o que vive nos entre-momentos, naquilo que nem todo mundo pára para perceber quão bonito é. Isso me toca, me emociona de verdade.
Não quero só fazer uma foto bonita, tecnicamente correta (vamos combinar que nem isso prezo tanto, eu amo os erros, ruídos e embaçados e outras interferências que acontecem pelo caminho). Quero fotografar a verdade e a beleza que existe no mais "banais" dos momentos, quero construir memórias autênticas que contem a história daquele momento da vida das pessoas.





Ainda não cheguei no momento mas sinto que estou chegando e construindo, pouco a pouco. Já faz muito tempo que queria falar isso mas não imaginei que seria agora. Fantasiava que iria mostrar as fotos do projeto que mencionei acima (se é que posso chamar assim) e falar sobre isso tudo, mas assim como eu amo a espontaneidade que vejo no mundo, estou pronta para conhecer e mostrar a espontaneidade que vive em mim. Quem sabe me aliar com essa característica não me ajude a enxergar?

Não quero esperar que este projeto fique pronto para divulgar ou que tenha o texto perfeito em que eu consiga ser absolutamente objetiva sobre o que quero ou que tenha um conceito definido. Prefiro ir descobrindo pelo caminho! Esse projeto nunca estará pronto, ele é orgânico, incontrolável e sempre estará em construção.
Assim como as fotografias que quero fazer, quero caminhar de forma crua e real. Sem ter planos e sem saber onde vou parar, quero somente ir, do jeito que eu realmente aprecio. E no meio do caminho me deparar com uma beleza banal da vida, dessas que existem aos milhões ao nosso redor e que nem sempre notamos.




5 comentários:

  1. Nossa, me identifiquei 100% com tudo que você disse! Até me assustei de tão acurada que foi sua descrição do que penso! Ainda não trabalho com fotografia, mas quando trabalhar, é exatamente isso que quero fazer: capturar a essência daquela pessoa ali, naquele momento. E também caminho nessa longa jornada de me descobrir (e descobrir minha fotografia, porque acho que uma coisa não se dissocia da outra) e saber exatamente o que eu quero e como eu quero. Porque na minha cabeça é tudo fácil, agora na hora de fotografar parece que tudo que eu penso vai pro ar e eu ainda fico muito perdida e com muita dificuldade em extrair o melhor de quem fotografo. Principalmente se tratando de adultos, já que a maioria é mais reprimida e não tem esse espírito livre, essa leveza e descontração frente à câmera que a maioria das crianças (principalmente as menores) tem.
    Sua fotografia me encantou muito e eu me identifiquei demais com o jeito que você encara ela. Se, um dia, fizer algum workshop, curso ou algo do género, eu com certeza vou querer participar!

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    1. Hoje cedo estava conversando com uma amiga, me questionei até que ponto fazer esses desabafos pode ser algo positivo. As vezes a coisa vem e aos poucos estou aprendendo a liberar e falar, o que por muito tempo preferia guardar para mim. É bom ver que existe uma certa ressonância, me faz ter mais acreditar que isso pode ajudar outras pessoas que estão buscando algo parecido.
      Fotografia é mesmo uma arte que diz muito a respeito do momento que estamos vivendo e acho que será sempre um processo de auto descoberta. É uma longa jornada e nem sempre é fácil colocar no papel o que sentimos, principalmente no início quando a questão da técnica ainda não está incorporada. Sinto que esses momentos em que as coisas fluem naturalmente, em que conseguimos captar a essência, são picos e que com o tempo eles vão acontecendo cada vez com mais frequência (tomara! rsrs). Depende muito a como estamos no dia e o nível de conexão e intimidade que temos com o outro, não é? Talvez no fundo seja mais uma questão de confiança e calma, ir sem expectativas e acreditar que sim, que vamos conseguir enxergar. E é tão bom quando o outro consegue também encontrar um lugar de sossego dentro de si e se mostrar sem medo e bloqueios. Daí a mágica acontece! Realmente com adultos é um pouco mais difícil, afinal todos nós temos nossas questões e conflitos internos e nem sempre é fácil baixar a guarda. No fundo... acredito que é uma questão de fé, de confiar em si mesmo, de se abrir e dar a cara tapa! E entender que é preciso começar a enxergar o mundo com o seu verdadeiro olhar e parar de criar uma imagem como a da referência que você viu na semana passada. Claro que isso também é parte do processo, parte do craft, mas uma hora é preciso abandonar, e quem sabe assim poder voar respeitando e sendo orientado pela sua própria essência.
      Laura, obrigada por ter comentado aqui e ter proporcionado essa reflexão! :)
      Espero que você consiga plantar uma sementinha de coragem e tranquilidade em você, que assim você possa se libertar um pouco mais e ir de encontro com o que está buscado!
      Beijos

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  2. Esse desabafo foi com certeza positivo, a menos pra mim! Logo antes de você fazer essa postagem, eu havia entrado no seu blog e visto fotos de uma festa de aniversário. Lembro que eu estava pensando dias antes em como eram poucos os fotógrafos que eu via que conseguiam realmente mostrar a atmosfera, o espírito mesmo da festa, e parece que você faz isso com uma facilidade invejável! Não sei se porque a dinâmica de festas é, na maioria, mais descontraída e as pessoas se soltam mais para a câmera, mas as fotos que vi tive quase que a sensação de ter sido transportada pra lá, de sentir mesmo o clima do ambiente! Você acha que as pessoas realmente ficam mais despreocupadas, descontraídas, com a câmera nas festas do que em ensaios? Ou é parecido?
    Com certeza fotografia é um processo de auto conhecimento!
    Eu faço faculdade de cinema, e semana passada teve a exibição de um filme (A História da Eternidade) lá. O diretor (Camilo Cavalcante) estava presente e comentou um pouco da produção do filme. Ele falou uma coisa que eu concordo muito e levo pra minha fotografia, que foi mais ou menos: "O que me interessa é o processo, e não o resultado. E se o processo for bom, não tem como o resultado não ser". Eu acho que é exatamente isso! Eu quero ser fotógrafa principalmente porque eu gosto de fotografar, e não porque gosto de fotos. É claro que eu gosto de fotos, mas só isso acho que não é suficiente, já que o processo de fotografar e fotos em si são coisas muito diferentes. Conheço muita gente que adora fotografia mas não fotografa, prefere ver fotos de fotógrafos, artistas. Eu quero ser fotógrafa porque o que me interessa mesmo é essa possibilidade de conhecer pessoas diferentes, de me conectar com elas e, de quebra, ainda poder entregar fotos que as lembrem daquele momento que passamos juntos, daquela época da vida delas. Acho que tem que sempre haver uma troca quando fotografamos. Não podemos exigir que a pessoa se abra, se solte, se não fazemos o mesmo com ela. E isso, pelo menos pra mim, é difícil, talvez a parte mais difícil!
    Mas enfim, acho que me empolguei um pouquinho, desculpa pelo tamanho do comentário! 😂
    Muito obrigada, desejo exatamente o mesmo pra você! Apesar de que, ao ver suas fotos, tenho a impressão de você já ter conseguido isso faz tempo!

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  3. PARTE 1
    rsrs

    Uau, posso responder um mês e meio depois? ahha Peguei o dia hoje para tirar o pó do blog!
    Nossa, desculpa a demora Laura! As vezes levo mais tempo para responder mensagens complexas como a sua (unicamente por trazer uma reflexão mais profunda), e daí a vida nos leva em uma correnteza e é preciso sair um pouco da água, sentar respirar rsrsr Se não faço isso não te respondo direito, e daí não tem graça ;)

    Talvez seja sim mais fácil alcançar esses resultados espontâneos em festa (depende da festa), afinal já é um lugar maior onde as coisas acontecem independentes de você e geralmente acontecem várias situações ao mesmo tempo. Cansou daqui, muda para lá, e assim você segue buscando momentos. Geralmente em festas as pessoas não ficam esperando a sua orientação ou pensando no que elas tem que fazer. Bom, as vezes ainda rola sim momentos como esse da pessoa não se soltar, não se sentir confortável com a câmera ou simplesmente por ainda estar presa com o conceito de que a fotografia tem que ser algo estático e posado. Em alguns momentos converso com as pessoas, sempre falo para os adultos "naaao, não pede para o seu filho sorrir não! está lindo assim!". Quando dá tento na hora mostrar um pouco da minha proposta.
    Mas existem festas e festas, depende da dinâmica, depende das pessoas. Mas grande parte depende da forma que você se aproxima e se conecta com as pessoas, do quanto você se apropria daquele momento. Claro, lembrando que é sempre um trabalho em dupla, uma troca. Você pode muito bem ficar distante com uma tele, meio à la safari caçando com seu rifle ou sendo um voyeur esperando o momento acontecer. Você se conecta com o ambiente mas não diretamente com as pessoas. Mas e se nada interessante acontece? E se são pessoas sentadas conversando calmamente, você vai passar quanto tempo esperando alguma coisa acontecer?
    Você também pode provocar momentos, provocar pessoas, provocar reações nelas. Mas para isso você tem que se jogar, e isso dá vergonha! Por isso que em festa é mais fácil, você se movimenta e sai do lugar, muda de cena se der vergonha rsrsr. Se você gosta de fotos em que você se sente dentro do momento, você tem que se aproximar, usar angular, brincar, sorrir, falar besteira. Você tem que se conectar com o outro ou então ser muito rápido para entrar e sair de cena sem que dê tempo dele mudar aquele momento por conta da sua presença.
    Mas mais uma vez, não depende só de você.... não é todo mundo que gosta desse tipo de abordagem, não é todo mundo que não se leva muito a sério, por isso não é sempre que dá para fazer esse tipo de aproximação. Você precisa sentir, e primeiro, estar bem com você, e se apropriar do que está fazendo e outro ponto importante, também não se levar muito a sério rsrs

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  4. PARTE 2:

    Ensaio tem outra dinâmica mas também é meio parecido, tudo depende da conexão e das expectativas. Você pode ter sorte e encontrar alguém que entende a sua proposta e flui como se você não estivesse lá. Tem ensaios que não. Alguns você nem consegue nem entender porque a pessoa te contratou, se chegou a ver o seu site antes rsrs Daí é conversar, na hora explicar o seu ponto de vista (ou não explicar, tudo depende muito), mostrar aonde você vê beleza, assim quem sabe a pessoa começa a enxergar também. Tem que tentar entender o que está prendendo o cliente, está preocupado com a aparência? É a expectativa? Não está saindo do jeito que ela imaginou? Por isso também é importante conversar antes do dia do ensaio, explicar a sua dinâmica, entender as expectativas do outro. E depois ter na manga algumas idéias caso a coisa não flua.
    Conversar antes do ensaio e até mesmo da festa é necessário para que você conhece um pouco mais a dinâmica da família e também a personalidade de cada um. Isso vai te ajudar na forma de se aproximar.

    Genial o que o diretor disse, pura verdade. Os trabalhos que eu mais gostei do resultado foram os que eu mais gostei no momento em que estava fotografando, foram os trabalhos em que eu estava inteira e conectada com as pessoas (e muito provavelmente essa festa que você viu foi uma dessas). Com experiência é possível você entregar um bom trabalho sempre mas não é sempre que você consegue entregar algo excepcional, depende te todos esse fatores que já falamos, você e o outro, a luz, o local... tudo influencia.

    Mas enfim Laura... dá para ir filosofando muito mais, uma hora que paro para pensar nisso tudo posso ficar falando por horas rsrs Fotografia é um bicho apaixonante e definitivamente um caminho de auto conhecimento ;)

    Obrigada mais uma vez por ter vindo aqui :)
    Bjos

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